Palavras ternas pousam sobre a minha boca mas nunca sobre o meu coração. Mas isto era só uma canção, que abafava a estúrdia que se desenrolava na parte da frente da casa. A porta vinha abaixo com os murros de uma tiazona muito enervada. Esta tiazona tem já uma certa idade mas a aparência é muito jovem, como é costume. Magra, de voz cava, loura, nariz pequeno, com uns óculos enormes no alto da cabeça. A porta vem mesmo abaixo. Ou é Titânio que a abre sem saber o que faz, com o cérebro líquido.

A tia entra, vaporosa e despachada atravessa os aposentos. A tentar perceber o que é aquilo, aquela macacada. A voz cava: — Onde é que se meteram? Que gente parva! — A luz é parca, o ar irrespirável. Titânio tropeça, nu, com o corpo moreno suado, limpa a baba que escorre da boca. Não sabe o que faz nem com quem está. Não sabe nunca com quem está porque dorme com demasiadas mulheres, mas ele e Kaytlin são velhos amigos. Ela foge para outra divisão às cabeçadas e a tia persegue-a. — Quem é a menina? O que faz? O quê? A menina não sabe nada, a menina é uma burra! Ponha-se a andar! — Kaytlin procura umas cuequinhas pretas, lembra-se agora que tinha umas cuequinhas pretas e não ouve nada. Titânio já está caído, sem sentidos.

No carro ficaram as outras duas crianças. Adolescentes. Estão nus, são brancos e a pele brilha como cera. Está calor e ficaram fechados. Um deles faz abdominais. O outro tem maminhas e anquinha flácida e masturba-se.

Titânio escapou-se para o terraço traseiro, fugindo da mãe — a tia. Atira-se para a relva seca de barriga para baixo. A um canto uma araucária cresce ao lado de uma prancha de bodyboard que não é sua. A boca sabe-lhe a caldo verde. Sobe-lhe ao cérebro a imagem de Rita Fontes Pereira Vitti. A Rita tinha as tetinhas apartadas, elevando-se cada uma para seu lado.


Nuno Marques Mendes